Após um período de instabilidade em abril, as bolsas dos EUA se recuperaram fortemente, atingindo novamente seus patamares históricos. Com essa retomada, surgiram análises sobre a possível sobrevalorização de algumas empresas, com múltiplos de negociação comparáveis aos da bolha da internet. No entanto, Google e Nvidia, segundo Thiago Kapulskis, gestor do fundo global de ações de tecnologia da São Pedro Capital, ainda apresentam preços considerados atrativos no mercado americano, mesmo entre as gigantes do setor.
Kapulskis, em entrevista ao Brazil Journal, expressou sua convicção de que o mercado não está em uma bolha, enfatizando que empresas como Meta, Microsoft, Google e Nvidia demonstram grande capacidade de geração de caixa. Ele deixou o Itaú, onde atuava como analista-chefe de tecnologia, e agora faz parte da equipe de Alex Dias, ex-presidente do Google no Brasil, na gestora São Pedro Capital.
O fundo Global Technology, sob a gestão de Kapulskis, busca identificar papéis subvalorizados de empresas com grande potencial, boa execução e atuação em mercados em expansão. Trata-se de um fundo long only, sem hedge ou trava de câmbio, com aplicação mínima de R$ 1 milhão, voltado para family offices e clientes high net worth, sem distribuição no varejo. A São Pedro planeja lançar em breve um fundo espelho offshore.
A carteira do fundo é composta por 15 a 20 papéis, todos de empresas de tecnologia. José Medeiros, co-gestor do fundo, reside em São Francisco e possui mais de duas décadas de experiência no Vale do Silício. Kapulskis ressalta que a área de tecnologia se expandiu significativamente nos últimos anos, transcendendo os limites de software ou hardware.
Kapulskis explora as principais apostas do fundo, com destaque para a Alphabet, controladora do Google. Ele aborda como capturar valor em um mercado que já apresentou um crescimento expressivo, enfatizando a busca por temas de longo prazo e a análise fundamentalista das empresas. O gestor menciona setores como ecommerce, digital advertising, cibersegurança e saúde como áreas de interesse.
Um aspecto fundamental para o fundo é avaliar o tamanho do mercado potencial. O objetivo é encontrar empresas que atuem em mercados com direção já definida, mas cujo crescimento ainda não se concretizou totalmente e promete ser robusto a longo prazo. Tendências como o aumento dos gastos no ecommerce, a crescente incidência de diabetes e a sofisticação dos ataques cibernéticos são consideradas vetores de crescimento independentemente de fatores externos.
A inteligência artificial (AI) se encaixa nessa lógica, com o valor gerado por ela se tornando cada vez mais evidente. Kapulskis também observa que existem temas com baixa penetração em mercados amplos, além da possibilidade de surgimento de novas áreas, como a robótica, que ainda está em fase inicial. O fundo prioriza investir em empresas que geram caixa, com poucas exceções, desde que a economia seja sólida e a trajetória de crescimento esteja clara.
Sobre a Nvidia, que atingiu um valor de mercado de US$ 4 trilhões, Kapulskis pondera que é necessário analisar esse valor em relação ao lucro esperado da empresa. Ele argumenta que a Nvidia negocia a 25 vezes o lucro, um patamar considerado natural para a empresa, que já negociou a 70 vezes. Para empresas como a Microsoft, um múltiplo abaixo de 30 vezes o lucro seria um ponto de atenção.
O gestor reforça sua convicção de que não há uma bolha, pois as empresas mencionadas geram muito caixa. Mark Zuckerberg, por exemplo, planeja investir centenas de bilhões com recursos próprios da Meta, sem necessidade de captação externa. Kapulskis compara essas empresas a utilities, com demanda futura contratada, destacando que grande parte do workload de computação está na nuvem, e as maiores empresas do setor detêm a maior parte desse mercado.
Embora considere o retorno dessas grandes empresas “OK” a “atrativo”, Kapulskis aponta que existem oportunidades interessantes fora das “Magnificent Seven”. Ele menciona a Alphabet como uma das teses de investimento do fundo, considerando-a um papel mais acessível entre as gigantes da tecnologia, mesmo diante de ameaças ao seu negócio central.
A análise da Alphabet envolveu um estudo aprofundado, com a participação de Alex Dias e conversas com grandes clientes. A conclusão é que o impacto da AI no Google se concentra em queries não comerciais, enquanto a parte comercial permanece relativamente estável. Além disso, a empresa demonstrou mudanças positivas na forma de se estruturar e se comunicar com os clientes nos últimos meses.
Kapulskis também comenta sobre a ameaça regulatória e o processo antitruste enfrentado pelo Google, que poderia resultar na divisão da empresa. A quebra do Chrome, por exemplo, teria um impacto significativo, já que o navegador é um importante canal para o Google, com 67% de participação de mercado. Entre outras Big Techs, ele destaca a Microsoft, que o fundo conseguiu capturar em um momento favorável.
Fora das gigantes da tecnologia, Kapulskis menciona a cibersegurança como um tema de interesse, com a adição recente da empresa Tenable à carteira do fundo. Ele destaca a liderança da Tenable no gerenciamento de vulnerabilidades, suas aquisições estratégicas e sua expansão para mercados adjacentes. O gestor acredita que as ações da Tenable podem ter um aumento significativo nos próximos meses.
Na área de saúde, Kapulskis observa que o setor está sendo negociado com o menor múltiplo em 15 anos, com algumas áreas ainda se recuperando dos investimentos realizados durante a pandemia. No entanto, ele ressalta que os vetores de crescimento permanecem sólidos, como o envelhecimento da população e o potencial da AI para acelerar a descoberta de medicamentos. O fundo investiu na Thermo Fisher, líder em equipamentos e reagentes para a indústria farmacêutica.
Por fim, Kapulskis comenta sobre o mercado de carros autônomos e a preferência do fundo pelo Uber em relação à Tesla, por acreditar que o Uber está na frente como agregador de serviços de transporte.
Via Brazil Journal