No Espírito Santo, a recente nomeação de um homem chefe presídio feminino no Centro Prisional Feminino de Cachoeiro de Itapemirim (CPFCI) gerou controvérsia. A decisão, tomada pelo Secretário de Justiça Rafael Pacheco, ignora tanto a legislação vigente quanto o potencial de 39 policiais penais femininas da região. Essa escolha levanta questões sobre a valorização das profissionais do sistema e o cumprimento das normas legais.
A nomeação de um homem chefe presídio feminino é vista como um desrespeito aos artigos 83 e 77 da Lei de Execução Penal. A legislação restringe a atuação de homens em presídios femininos, visando proteger as internas e garantir um ambiente mais seguro. A justificativa do Secretário de Justiça, baseada no profissionalismo do servidor nomeado, não se sustenta diante dos princípios que regem a gestão penitenciária em espaços de vulnerabilidade de gênero.
Mesmo que o servidor tenha experiência como diretor-adjunto, sua nomeação para o cargo máximo não está alinhada com a Constituição Federal, que preza pela dignidade da pessoa humana e pela proteção especial às mulheres. A presença de um homem chefe presídio feminino traz riscos estruturais, como a possibilidade de abusos sexuais e controle emocional sobre internas e servidoras.
O artigo 83 da Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210/84) é claro: o estabelecimento penal feminino deve ser dirigido por mulher. Essa norma não é apenas simbólica, mas uma salvaguarda para proteger as internas contra abusos e exploração. A nomeação de um homem chefe presídio feminino perpetua uma irregularidade, agravada pela formalização da autoridade máxima.
A lógica da precaução, que exige a prevenção de riscos antes que se concretizem, é ignorada na decisão de nomear um homem chefe presídio feminino. O sistema prisional brasileiro é um ambiente vulnerável a assédio, coação e violência sexual, muitas vezes encobertos. A prevenção desses abusos exige estruturas que dificultem violações, incluindo o respeito à direção feminina.
A alegação de que o histórico funcional do servidor o torna apto para a direção perpetua uma lógica institucional masculina. Essa lógica minimiza a importância da representatividade feminina em espaços de poder no sistema penitenciário. A existência de 39 policiais penais femininas em Cachoeiro e a experiência de 11 diretoras e 7 diretoras-adjuntas no estado tornam a nomeação ainda mais questionável.
A vice-presidente do Sindppenal, Letícia Lugão Machado, expressou a frustração da categoria, ressaltando que a lei de execução penal deve ser cumprida. O sindicato defende os interesses dos servidores penitenciários e o cumprimento das leis. A demanda das policiais penais femininas, que se sentiram desprestigiadas, reforça a importância de valorizar a experiência e qualificação das mulheres no sistema.
A nomeação de um homem chefe presídio feminino representa a perda da oportunidade de fortalecer a gestão do CPFCI com uma liderança feminina. Especialistas apontam que a gestão feminina promove um ambiente mais adequado para as internas e para o tratamento de questões sensíveis como violência de gênero.
O advogado Pablo Laranja, especialista em segurança pública, destaca que a liderança masculina em presídios femininos exige atenção redobrada do Estado. A maioria das mulheres encarceradas tem histórico de violência e abuso sexual por homens, o que compromete a confiança e a transparência na unidade prisional.
Laranja também aponta que decisões administrativas que não consideram as especificidades do encarceramento feminino tendem a ser menos eficazes. A representatividade feminina em cargos de gestão promove um ambiente mais empático, com maior abertura ao diálogo e respostas adequadas às demandas do universo prisional feminino.
A liderança feminina também impacta positivamente na formulação de políticas de ressocialização para mulheres e no tratamento de denúncias de violência de gênero. A presença de mulheres na chefia cria um espaço mais propício para escuta, acolhimento e confiança, rompendo com a cultura de invisibilização dessas denúncias.
A nomeação de um homem chefe presídio feminino pode gerar impactos significativos nos direitos humanos, na segurança e na dignidade das mulheres presas. Essa prática pode intensificar desigualdades estruturais, fomentar ambientes de assédio e comprometer os mecanismos de proteção das internas. Estudos apontam para casos recorrentes de assédio e violência institucional em cadeias femininas sob direção masculina.
Instrumentos internacionais, como as Regras de Bangkok, recomendam uma abordagem sensível ao gênero na gestão de estabelecimentos penais, enfatizando a importância de políticas específicas para mulheres presas e a composição de equipes técnicas e administrativas. A lista de diretoras e diretoras adjuntas do Portal da Transparência demonstra a existência de mulheres qualificadas para a função, levantando questionamentos sobre a decisão de nomear um homem chefe presídio feminino.
A controvérsia em torno da nomeação de um homem chefe presídio feminino reacende o debate sobre a importância da representatividade de gênero e o cumprimento da legislação no sistema prisional. A decisão do Secretário de Justiça do Espírito Santo, Rafael Pacheco, desafia as normas e princípios que visam proteger as mulheres encarceradas, levantando sérias dúvidas sobre os critérios de escolha e o reconhecimento do papel da mulher na gestão prisional.